quinta-feira, 22 de junho de 2017

Cuidado ao olhar para os lados.
Uma coisa com um formato familiar pode querer te comer.

Na verdade.

Algo já te come por dentro há muito tempo.

Subitamente orientados pela abjeção a abismos,
Sempre estivemos em um.
Caindo.

Com as pálpebras danificadas.
Tentando enxergar de olhos fechados.

quarta-feira, 21 de junho de 2017

MerciMaré

Respira.
Respira.
Olha o mar.

Não tem porque cessar
Agora.
Ancorar em locais proibidos,
Fora de margens estreitas.
Difícil entrar,
Mais difícil sair.

Ainda bem que aprendi a nadar.

Fugir de correntes desconhecidas.
Encostar o pé no chão.
Areia.
Amarela, branca, vermelha.
Barro de lagoa nas unhas.

E pra sempre ter água por dentro.
E por fora.
Secando, enchendo,
Que nem maré.

Respira.
Respira.
Olha pra dentro.

Primeiro entender suas marés.
Pra depois pular
De suas pontes.

sexta-feira, 9 de junho de 2017

a volúpia agora é matéria monetária
e pouco importa quantas morrem
quantas caem

os famintos de brutalidade
atacam por trás e comem até a pele
nada resta se não mais um descaso

portas e janelas batem com força
enquanto a lua cresce com medo
na rua escura histórias se repetem

morrer morrer morrer morrer
a sede dos que acham que são maiores
acaba sugando nosso suor e sangue


quinta-feira, 8 de junho de 2017

dancei durante três horas debaixo da minha mangueira preferida
carros e motos passavam pela estrada ao lado separada apenas
por uma cerca de arame farpado que brilhantemente atuava
como linha tênue enquanto eu dançava debaixo da minha mangueira
os carrapatos e bichos de pé as minhocas e os cachorros
todos eles assistiam minha dança desgovernada
o cheiro de feijão que passava pelos tijolos machucados
anunciava que gritos viriam por aí chamando seu fernando
que antes de pegar faca chapéu e água pra entrar na mata
fazia questão de acordar junto com o sol pra tomar café com ele
perto da estrada existiam duas mangueiras maiores que a casa
quando eu subia na maior delas eu podia ver uma lagoa
a lagoa ficava no final da estrada que os carros e motos passavam
as paredes da estrada eram feitas de muita mata verde
quando não existia barulho de motor dava pra ouvir as histórias dos bichos
um dia eu tava sentada lá na cabeça da árvore e o céu começou a chorar
foi a coisa mais bonita que vi e quando eu fechava os olhos
conseguia ouvir o barulho das gotas rasgando a água da lagoa
nesse dia eu me senti bicho da natureza e comecei a existir